segunda-feira, 28 de junho de 2010

Crónica de S. Tomé ( por Rita Aleixo )

A folha da bananeira

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Cá continuo submersa nesta ilha, que me consome. O meu motorista teve um acidente com o carro que capotou há mais de dois meses; ficou parado mais de um mês na oficina a tratar da chaparia, enquanto ficámos à espera dos vidros que viriam de Portugal, por não existirem cá. Entretanto passaram os dois meses e nada de vidros. Aborreci-me a sério com o homem da seguradora (responsável pela compra dos vidros) e ele resolveu então encomendá-los também aos nigerianos. Eu lembrei-lhe a falta de qualidade do material proveniente da Nigéria, coisa de que ele próprio me avisou desde o princípio, e respondeu-me: “pode ser que dê sorte…”. No fim dos 3 meses chegaram os famosos vidros, os de Portugal, mas não eram do tamanho dos do nosso carro, apesar das referências correctas terem sido fornecidas. Voltei a insurgir-me com a seguradora e perguntei pelos vidros dos nigerianos, tendo sido informada de que haviam chegado ao país, partidos. Falei com o motorista para revermos as medidas dos vidros, apesar da referência ser a informação mais exacta (mas aqui tudo muda…), e ele respondeu-me que já tinha a medida certa e apresentou-me um pedaço de folha – folha de bananeira! – correspondente à medida exacta do vidro. E lá fui eu com o pedaço de folha de bananeira para a seguradora, na esperança de que desta vez a medida venha correcta. Aguardo pois com ansiedade.
Por outro lado sou também responsável pela coordenação de umas obras de reabilitação, articulando-me para o efeito com um empreiteiro. Não vale a pena dizer que não percebo nada de obras nem dos respectivos materiais. Mas estava eu descansada e pensando que pelo menos estes trabalhos estariam concluídos quando o dono do edifício se me vem queixar de que a obra não terminou, que umas calhas ficaram por colocar e umas madeiras por comprar! Tento perceber a situação e constato que a obra não foi concluída porque o vizinho do terreno ao lado tem uma bananeira que impediu a colocação das calhas! Tentámos convencer o velhote, dono do terrreno, a que cortasse a árvore, mas ele recusou-se porque se trata de uma bananeira que está já pronta para dar bananas! Então lá fico eu e o dono do edifício a pensar em alternativas para a solução do problema …e eu a pensar nas bananeiras! Vistas de fora, estas situações têm um lado cómico, eu sei, mas vistas de perto são uma fonte de aborrecimentos...
Ainda durante a mesma semana e no âmbito da equipa técnica de que faço parte para dar apoio a um Ministério tendo em vista a apresentação de uma proposta para um projecto ser financiado na área de saúde deparei-me com a seguinte realidade: o dito Ministério não dispõe agora de portáteis para trabalhar, só tem um computador de mesa, o que só por si não seria dramático, não fôra a falta de energia quase sistemática que obriga a paragens constantes num trabalho que é urgente. A agravar a situação o gerador está estragado. Quando pergunto pelos portáteis que conhecera ali há tempos dizem-me que estão todos avariados, pois não têm antivírus. Então o que fazemos? Ficamos sentados à espera que a luz venha…uma, duas, três horas…até que arranjam outro espaço noutro sítio e depois de lá instalados, e dos trabalhos reiniciados, eis que a energia também desaparece desse local ! Enfim, poderia partilhar outras tantas aventuras, mas acho que por hoje fico por aqui, e espero poder visitar-vos com mais frequência. BEIJOS DE SÃO TOMÉ
Rita Aleixo

14 comentários:

Anônimo disse...

Oh Rita,
Quinhentos anos de colonização portuguesa deixam as suas marcas...
Não conhece a célebre anedota dos portugueses que umas vezes não têm balde, outras vezes não têm conteúdo para o balde e, quando reúnem as duas coisas, fazem greve?

Beijos,
PM

CamilaSB disse...

E há vidros desejosos para se encostarem à sombra da bananeira...mas vêem-se gregos (ou será nigerianos...) para lá chegarem inteiros, ou com as medidas certas...
Olá Rita...ficam os meus votos, para que lhe resolvam todos os assuntos relacionados com as palmeiras, com a devida urgência e desenvoltura! Beijinho!

Baila sem peso disse...

Compreendem-se aventuras
com esperas de amarguras...

espero com simpatia
que da noite se faça dia...
onde reina breu, surja luz de alegria!

Beijinhos

Unknown disse...

É o local ideal para as minhas férias, uma ilha sem luz, compotadores, net, porreiro eu vou eu quero ir para a ilha.

Maria Ribeiro disse...

RITA E EDUARDO ALEIXO: beijem o ar de SÃO TOMÉ por mim!
VIVI Lá e nunca esqueci o chamamento desse país...até haver possibilidades económicas de lá voltar. EStive a viver na Roça Colónia Açoreana e na ÁGUA IZÉ...
GOZEM , COM SAÙDE , ESSE ÉDEN...
BEIJINHOS DE
LUSIBERO

Lumena Oliveira disse...

Olá querida Rita e Eduardo Aleixo!

S. Tomé neste momento seria umas belíssimas férias para mim. Como tenho saudades desse clima, da comida, das praias, da praia das sete ondas, linda!, dos frutos exóticos e saborosos, da floresta verdejante, com 72 cores.
Vi há dias um blog com tantas fotos de S.Tomé que até fiquei emocionada, e fiquei maravilhada com zonas que foram melhoradas. Simplesmente lindo!
Fora isso, o que a natureza nos oferece, existem contra-tempos muito desagradáveis. Mas, espero que resolvas esses problemas o mais depressa possível.

Um beijo,
Lumena

Irene disse...

Rita!
Voy leyendo de vez en cuando el blog de tu padre y hoy he visto tu crónica. Tuve ocasión de compartir alguna de las anécdotas que escribes y tengo que decirte que, a pesar de ser realmente divertidas para quien las escucha, son un pequeño drama cotidiano que va sumándose al desasosiego de vivir en Sâo Tomé.
Ánimo, mi niña. Y un abrazo gigante.

Pronto te enviaré lo prometido.

Muàs!

Manuela ramos Cunha disse...

Eduardo, por favor pede à tua filha se me arranja a ir para a beira dela?
Aqui só há bananas que andam nas trevas, quem sabe em S. Tomé - e ver para crer - se encontra luz?

Nem só de pão perecível vive o homem (computadores, telemóveis, TVS, SportTVs...tudo isto um dia pode ir por água abaixo e depois? - que fazer sem estes apetrechos? Esperamos...

Que maravilha de vivência por territórios aonde o homem não matou a frescura, o silêncio, a noite!- também ía bem para a ilha!!!

Abraço à Rita e que ela tenha paciência...nem tudo são rosas!
Um beijo

Lumena Oliveira disse...

Olá Eduardo Aleixo,

Tenho uma surpresa para ti. Dá uma olhada no meu espaço.

Grata,
Lumena

gaivota disse...

cada vez me sinto com mais vontade de ir até s. tomé! há anos que está "na linha"
hei-de ir!
bom trabalho, rita
beijinhos

Paula Raposo disse...

Obrigada pela partilha dessa realidade.
Beijos e boa sorte!

fatima.medeiros disse...

Olá Rita
Trabalhar em África é isso mesmo: lidar diariamente com essas "pequenas/grandes" dificuldades, mas em contrapartida receber todos os dias um milhão de sorrisos das pessoas para quem trabalha, contemplar essa natureza magnífica e saber que está a contribuir para o bem estar de toda uma comunidade!
Obrigada Rita!
Fátima Medeiros

Graça Pires disse...

Gosto das tuas reportagens de São Tomé, Rita. Mas essas aventuras são desventuras e problemas difíceis de resolver quando o país é pobre. Que tudo comece a correr melhor. Um beijo.

Lucília Benvinda disse...

Como sempre, uma delícia ler estas crónicas... apesar dos contratempos.

Uma riqueza em vivências, ainda que pobres, podem fazer o desepero de quem as passa, mas o prazer de quem as lê.

Nunca tenho palavras para mais apreciar o que leio nas tuas crónicas, Rita.
Obrigada! (Talvez só comoção)

Um abraço,
Lucília