sábado, 15 de junho de 2013

MOMENTO


- Poema de Rita Aleixo

Algo rebentou.
Uma semente
Um soluço de absoluta necessidade
Uma tristeza demasiado pesada
Para continuar ali presa no esquecimento.
Ficaste parado, como que em câmara lenta,
À espera de perceber o que de estranho se passara.
Que acontecera?
Permaneces aí enquanto o vento rebola na tua face,
Enquanto as pessoas passam distantes
E as folhas caem das árvores nuas para o inverno.
E tudo à volta gira, seguindo o natural  ritmo das coisas.
Os dias passam, as horas flutuam umas sobre as outras,
Noites e novos dias sobrepõem-se,
Tudo está em movimento excepto
Esse momento em que te encontras aí
Longe do tempo que parece ter parado embasbacado
Por uma certa indeterminada razão que ainda
Não surgiu em ti.
Surpreso como tu, parece esperar que te recomponhas
Para então também seguir em frente
Com o presente estacado nas profundezas do passado,
E com o que passou presente a cada  instante
Desse momento vazio onde tudo se move menos tu.


Algo mudou.
Um estremecimento interior
Um murmurar incessante
Uma fina gota cortante
Algo cujo impacto parece ter abalado os alicerces
Por onde respiravas, por onde andavas, por onde tudo fazias.
Tudo à tua volta traz asfixia, prisão, fragilidade
Tudo parece desmoronar com uma maior facilidade que um
Baralho de cartas jogado ao mar.
Apetece chorar, desistir, desfalecer.
As vozes ecoam incertas,
A clareza de outrora esvai-se, distancia-se, já não se encontra
em lado nenhum.
Tudo parece ter desaparecido tal como era
Tal como sempre o tinha sido
A ilusão, os sons, as imagens do quadro somem-se
Com o olhar de cada minuto focado
Em tudo o que ali estivera e já não existe.
Não mais...
Talvez nunca mais
Talvez nunca lá tivesse estado.

A folha ficou em branco

Pronta para um novo tempo que há-de vir...
Rita Aleixo

In, "Antologia de Poesia Contemporânea - Entre o Sono e o Sonho - Volume III
Chiado Editora - Fev. 2012

( Foto Net )

10 comentários:

tb disse...

um momento de beleza terna e pura...
parabéns à Rita e caso para dizer: filha de peixe sabe nadar, que é como quem diz, filha de poeta sabe poetar. :)
Beijinhos aos dois

gota de vidro disse...


Um belo poema.

Na vida temos sempre uma folha em branco pronta para ser escrita ou reescrita.

Gostei muito Rita.Há profundeza nesta escrita.

Bom fim de semana

Beijinho da Gota

Sonia Schmorantz disse...

Lindo poema!!!
Um abraço

pedro martins disse...

Um bom 'Momento' para uma 'casinha' nova.
'Bêjos'
PM

Isa Lisboa disse...

A nossa vida tem sempre momentos assim, mas, felizmente, outros melhores vêm sempre. É um poema muito intenso de que gostei muito!

Abraço, bom fim de semana

Isa Lisboa
=> Instantâneos a preto e branco
=> Os dias em que olho o Mundo
=> Pense fora da caixa
=> Tubo de ensaio

Rita Freitas disse...

Lindíssimo!

Bjs

Rita disse...

Obrigada a todos :)

Beijos RA

Unknown disse...

Momentos!! A vida é feita de momentos!! Não é feita de mais nada a não ser de momentos,sejam eles bons ou maus. Devemos encarar estes momentos sempre com o maximo de alegria possivel,nunca nos entristecermos. Boa semana!! Fica com deus!!

© Piedade Araújo Sol (Pity) disse...

a ternura pelas mãos da Rita.
muito belo e sensível.
um beijo

;)

Manuela ramos Cunha disse...

A Rita é uma mulher madura, sensata, e muito descritiva na sua apreciação do real que a rodeia.
Muito bom este texto/poema, de grande fertilidade, poesia e lucidez!

Gostei muito Rita e acho que não ficas nada atrás do "papá" em matéria de deixar correr a pena, sobre emoções, ilusões e principalmente...sabedoria!

Beijinho, Nela